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sexta-feira, 14 de março de 2014

O tráfico humano é uma vergonha


            O tempo da Quaresma é o tempo forte à conversão e à mudança de vida. Para nós, no Brasil, temos a Campanha da Fraternidade, refletindo sobre o tema: “Fraternidade e tráfico humano” e sobre o lema: “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5,1). Ela lança sementes para a construção de uma sociedade fraterna e solidária.

Aos poucos, vai se mostrando a realidade cruel e vergonhosa do comércio de seres humanos para as mais diversas finalidades, como o trabalho escravo, o entretenimento, a exploração sexual, a adoção ilegal, a comercialização de órgãos, entre outras. As vítimas, geralmente, são atraídas por promessas de trabalho e emprego, boas condições de vida em outras cidades ou países. Pessoas que buscam sair de situações difíceis para encontrar um pouco de serenidade e de paz; um lugar melhor para si e para as suas famílias, mas não encontram compreensão, acolhida, solidariedade!

            Desde tempos remotos, o tráfico de pessoas foi praticado amplamente e até aceito, geralmente, em vista do trabalho escravo. O Brasil conviveu por séculos com a escravidão de índios e africanos; estes últimos eram adquiridos, traficados e comercializados como “coisa” num mercado vergonhoso, mas florescente. Foram necessários séculos para que a escravidão fosse formalmente proibida.

Mas o problema existe atualmente de forma vergonhosa. A forma contemporânea de escravidão é bem mais difundida e grave do que se pode imaginar e está sendo favorecida pela globalização das atividades econômicas ilegais e clandestinas. Hoje, como no passado, essa atividade criminosa envolve organizações e redes nacionais e internacionais, com altos ganhos.

O tráfico humano envolve o crime organizado, com uma complexa estrutura que relaciona meios e fins para facilitar suas atividades; há aliciadores, fornecedores de documentos falsos e de assistência jurídica, transportadores e lavagem de dinheiro. Há rotas nacionais e transnacionais de tráfico de pessoas. No Brasil, a Região Amazônica apresenta o maior número dessas rotas, seguida pelo Nordeste.

Um crime invisível e silencioso, seu enfrentamento é difícil; as vítimas geralmente não denunciam, uma vez que elas passam a viver em situação de risco e de constrangimento. Além da vulnerabilidade social e econômica, elas têm sua dignidade degradada.

Como enfrentar esse câncer social? Em 1999, a ONU realizou a Convenção de Palermo, contra o crime organizado transnacional, e seus protocolos estão em vigor desde 2003, definindo o tráfico humano como “o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo-se à ameaça ou ao uso da força, ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade, para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outras para fins de exploração”. O Brasil adotou essa Convenção em 2004; desde 2008 tem o seu próprio Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Há numerosas iniciativas de organizações da sociedade civil que se dedicam ao enfrentamento do tráfico de pessoas. A Igreja Católica também tem suas pastorais voltadas para essa problemática.

Ninguém quer ser vendido, mas se deixa iludir por promessas falsas. Eis uma boa ocasião para uma tomada de consciência mais ampla sobre as dimensões e a gravidade do problema e para suscitar iniciativas e decisões para enfrentar esse vergonhoso câncer social em nosso País. Não sejamos indiferentes com a exploração da pobreza dos outros. Cristo nos libertou!


Dom Francisco de Assis Dantas de Lucena
(Bispo Diocesano de Guarabira)
 

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